N°23 / La psychologie politique en Europe Juillet 2013

A Psicologia Política como campo interdisciplinar a partir da experiência da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo

Thomaz Ferrari D'Addio, Lorraine Lopes Souza, Guilherme Borges da Costa, Fábio Eduardo Bosso

Résumé

A criação do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo (GEPSIPOLIM) em 2007 foi o resultado de um esforço interinstitucional, pois nasceu com a participação de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) e da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). O novo grupo nasce marcadamente interdisciplinar, pois o compõem pesquisadores que iniciaram suas trajetórias na Filosofia, Pedagogia, Sociologia e Psicologia. O esforço conjunto de alunos de graduação foi fundamental na consolidação do grupo de pesquisa, uma vez que esses (as) pesquisadores-estudantes, por meio de suas investigações dirigidas por professores-doutores, ajudaram a traçar de modo mais radical essa característica interdisciplinar, pois provinham de graduações de corte híbrido e encontraram na Psicologia Política um caminho seguro para responder muitas de suas inquietudes. Esses (as) estudantes trabalharam questões como gênero, direitos, movimentos sociais, políticas públicas, relações multiculturais, sindicalismo, identidades coletivas, sempre fazendo pontes entre conhecimentos de fronteiras, preocupados (as) com os elementos subjetivos dos fenômenos políticos e coletivos. Diferentemente de outros grupos que concentram psicólogos, com pós-graduação em Psicologia, este foi cada vez mais se abrindo para uma concepção de Psicologia Política na qual a Psicologia e a Política sozinhas não são suficientes para responder as múltiplas questões que são próprias da Política e que não se reduzem a uma mera Psicologia da Política ou a uma Política da Psicologia. Assim, o GEPSIPOLIM vem se consolidando como um espaço plural e aberto aos encontros e à atuação de pesquisadores (as) e estudantes da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (uma unidade Interdisciplinar) da Universidade de São Paulo (EACH/USP). A partir do grupo da EACH/USP também nasceu o primeiro curso de especialização em Psicologia Política (Lato Sensu) do país e contribuiu significativamente para a criação do Mestrado em Mudança Social e Participação Política, no qual são ministradas as disciplinas de Psicologia Política e Políticas Públicas e de Psicologia dos Movimentos Sociais. Neste artigo, buscaremos realizar um exercício de memória sobre a própria existência do grupo, sobre suas ações e suas produções intelectuais que revelam esta característica de interdisciplinaridade da Psicologia Política.

La psychologie politique comme un chantier interdisciplinaire à partir de l´expérience de l´École des Arts, Sciences et Humanités, de l´Université de São Paulo
La création du Groupe d'Études et de Recherche en Psychologie Politique, Politiques Publiques et Multiculturalisme (GEPSIPOLIM) en 2007 a été le résultat d'un effort inter-institutionnel, puisque il est né avec la participation effective de chercheurs de l'Université de São Paulo (USP), de l´Université « Julio de Mesquisa Filho » (UNESP) et de l'Université Catholique de São Paulo (PUC-SP). Le nouveau groupe est né nettement interdisciplinaire, car il comprend des chercheurs qui ont commencé leur carrière en philosophie, pédagogie, sociologie et psychologie. Toutefois, il est né comme un groupe de recherche dans lequel le travail et le nombre d'étudiants de la licence était essentiel afin qu´il puisse être consolidé. Ces chercheurs-étudiants, à travers de leurs enquêtes menées par les enseignants, ont permis de consolider plus radicalement cette caractéristique interdisciplinaire, car ils sont venus de différentes licences et ils ont trouvé, dans la Psychologie Politique, un chantier sûr pour la poursuite de leurs travaux. Ils ont travaillé sur les enjeux de genre, des droits, des mouvements sociaux, des politiques publiques, des relations multiculturelles, de syndicalisme, des identités collectives, en faisant toujours des liaisons entre la connaissance des frontières, toujours préoccupés avec les éléments subjectifs des phénomènes politiques et collectives. Contrairement à d'autres groupes où se concentrent des psychologues avec des études supérieures en psychologie, le GEPSIPOLIM a été de plus en plus ouvert à une conception de la psychologie politique dans laquelle la psychologie et la politique elles-mêmes ne suffisent pas à répondre aux nombreuses questions qui sont propres de la politique et qui ne se réduisent pas à une psychologie de la politique ou une politique de la psychologie. Ainsi, ce groupe a été consolidé comme un espace pluriel et ouvert pour les débates et travaux des chercheurs et étudiants de l'École des Arts, Sciences et Humanités, une faculté interdisciplinaire de l´Université de Sao Paulo (USP). Du GEPSIPOLIM est également né le premier Cours de Spécialisation en Psychologie Politique (lato sensu) du Brésil, et il a contribué de manière significative à la création du cours de Master en Changement Social et Participation Politique, dans lequel les disciplines « Psychologie Politique et les politiques publiques » et « Psychologie des mouvements sociaux » sont offertes. Dans cet article, nous effectuons un exercice de mémoire sur l'existence même du groupe au sujet de ses actions et sa production intellectuelle qui révelent cette caractéristique interdisciplinaire de la Psychologie Politique.

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Introdução

No Brasil, a primeira disciplina com o nome “Psicologia Política” foi ofertada em 1965, no curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Minas Gerais. No entanto, tal disciplina ganhou força no país, de fato, com a criação do grupo de trabalho em “Psicologia dos Movimentos Sociais”, na Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia (ANPEPP), em 1983. Em 2000, a realização do I Simpósio Nacional de Psicologia Política, organizado pelo Núcleo de Psicologia Política e Movimentos Sociais, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) contribuiu para o fortalecimento do campo no país. A partir deste evento, nasceram a Associação Brasileira de Psicologia Política (ABPP) e a Revista Brasileira de Psicologia Política (SILVA & ZONTA, 2010).

O presente artigo se propõe a apresentar e discutir o trabalho do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo (GEPSIPOLIM), da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP). Com pouco mais de cinco anos de existência, este grupo reúne cerca de 50 pesquisadores e estudantes-pesquisadores que têm realizado pesquisas, publicado artigos e livros, organizado cursos e eventos que auxiliam na consolidação da Psicologia Política no Brasil, e também na organização latino-americana da disciplina, ao encabeçar e participar da Associação Ibero-Latinoamericana de Psicologia Política.

Bases teóricas

A Psicologia Política, disciplina que reaparece no circuito acadêmico na década de 1980 (DORNA, 1989), é marcada por uma dialogicidade com as demais disciplinas, seja em uma perspectiva teórica, seja na metodológica. É marcada ainda por sua característica bem própria de reunir pesquisadores em busca de respostas diante da crise política que se instaurou com a modernidade (DORNA, 2006). Seu reaparecimento nos remete ao que Fourez (1995) destaca sobre o surgimento de novos paradigmas disciplinares. Para este filósofo, uma disciplina científica nasce de acordo com um novo contexto sociopolítico e econômico, e a fim de compreender as novas estruturas da sociedade. Afinal, “há objetos de estudos que só aparecem em um dado momento histórico. Por exemplo, para que se possa falar de psicologia, é necessário que se tenha uma certa concepção do ser humano como indivíduo” (FOUREZ, 1995, p. 104).

Entretanto, para além deste elemento cultural, ele destaca que para a construção de uma disciplina que se pretenda científica, sempre se considerou ser necessário haver um “certo número de regras, princípios, estruturas mentais, instrumentos, normas culturais e/ou práticas, que organizem o mundo antes de seu estudo mais aprofundado“ (FOUREZ, 1995, p. 105). Este processo resultaria no estabelecimento de um “paradigma científico”, o qual seria constituinte daquela disciplina.

Ao tratar do estabelecimento de paradigmas científicos, o filósofo francês faz referência a Thomas S. Kuhn que, segundo ele, evidenciou que uma ciência tem data de nascimento e interesses específicos para tanto. Segundo Fourez, Kuhn apresentou a distinção de dois momentos bem diversos da prática científica. A estes chamou de “ciência normal” e de “revolução científica”. O primeiro momento seria aquele em que os cientistas, dentro de um já determinado paradigma, buscam a resolução de problemas, enquanto que no segundo, o âmbito paradigmático de uma disciplina é que está sob questão.

De acordo com Kuhn e Fourez, quando uma disciplina já está estabelecida, o que poderia ser chamado de “período paradigmático”, seu objeto se apresenta relativamente estabilizado e suas técnicas são claras. Entretanto, este momento não é eterno, sob risco de a disciplina perder seu contato com o “externo”. Então se inicia um processo de questionamentos sobre a base que a constitui, o que poderíamos compreender como um momento de “revolução científica”.

Este segundo momento, parece-nos se relacionar com o que passa a Psicologia Política. Parisi (2007), inclusive, analisa que o surgimento da psicologia política poderia ser marcado, assumindo a nomenclatura de Khun, como um momento de “revolução científica” no interior do pensamento psicológico, filosófico, político e sociológico. A respeito desta perspectiva, Dorna (2002) aponta que a ciência, que há três séculos se apresentava como capaz de organizar cientificamente a humanidade, compreender e modificar racionalmente a natureza, inclusive a humana, hoje tem essa verdade questionada. O otimismo teria dado lugar a um ceticismo que, em alguns casos, se confunde com resignação e em outros com niilismo. Assim, o autor aposta que a Psicologia Política poderia “se converter no centro de reintegração das ciências sociais” (DORNA, 2002, p. 40).

Entretanto, segundo afirma, esta disciplina possui um “continente” a ser explorado e para se firmar dentro do status acadêmico e assumir seu papel no seio das ciências humanas e sociais seria preciso enfrentar duas questões essenciais: de um lado a ausência de um paradigma único do campo dos fenômenos psicopolíticos, bem como de um quadro teórico de explicação e de métodos de estudo do comportamento humano em sociedade e, de outro, a ausência de uma definição comum, entre os pesquisadores, acerca da Psicologia Política.

Sabucedo (1996, p. 22) define a Psicologia Política como o “estudo das crenças, representações ou sentidos comuns que os cidadãos têm sobre a política, e o comportamento que estes, seja por ação ou omissão, tratem de incidir ou contribuir para a manutenção ou mudança de uma determinada ordem sócio-política”. Parisi (2007), em trabalho que buscou uma definição para tal disciplina, se apóia em Oblitas e Rodríguez Kauth, que definem a Psicologia Política como uma

(...) área da psicologia contemporânea que se dedica à análise dos fenômenos políticos em função de seus aspectos psicológicos; à interação em fenômenos de incidência política em função de princípios psicológicos; a análises críticas na interpretação de fenômenos políticos e a análises de tópicos selecionados como poder, liderança política, corrupção, entre outros (apud PARISI, 2007, p. 14).

O autor acrescenta a esta definição as análises das influências dos modelos políticos vigentes sobre a construção e determinação de modelos psicológicos; dito de outra forma, “a utilização da psicologia por parte dos sistemas políticos dominantes, como disciplina a serviço do controle social” (PARISI, 2007, p. 14).

Tantas perspectivas para definir a Psicologia Política, levaram Barracho (2011), após revisão de literatura, concluir que tal disciplina tem se dedicado ao estudo dos fenômenos cujos aspectos psicológicos são concernentes à política.

Ela pretende, pois, compreender e explicar questões de relevância social, tais como o comportamento dos líderes políticos, os seus traços psicológicos, valores, opiniões e atitudes e ainda os contextos inerentes à sua participação e intervenção, seja ao nível do tipo de influência exercida e respectivos efeitos sobre os pequenos grupos, como ao nível de instituições mais alargadas ou de grande massa popular, que englobam ainda a opinião pública e a propaganda, as relações e conflitos entre grupos sociais, a socialização política e as relações internacionais (BARRACHO, 2011, p. 61).

Dorna aponta alguns caminhos, como o olhar conjunto entre dois ou mais campos do conhecimento, a perspectiva transversal e integrativa, para que a Psicologia Política se constitua como disciplina acadêmica, o que nos parece ir ao encontro do que Fourez debate sobre interdisciplinaridade, embora este último apresente duas perspectivas para o que considera uma visão interdisciplinar da ciência. A primeira entende a interdisciplinaridade como a mescla de diferentes disciplinas que resultará em um novo enfoque, e a segunda como uma prática específica que visa solucionar problemas relativos ao cotidiano, sem a busca de um novo discurso científico.

Esta segunda perspectiva nos parece mais apropriada para compreender a constituição da Psicologia Política como disciplina. Apesar de reunir elementos de outros campos do conhecimento, sua característica principal nos parece ser justamente a possibilidade de observar dilemas do cotidiano, se empenhando em fazê-lo a partir da articulação entre elementos da exterioridade (compreensão dos processos sociopolíticos, econômicos, biológicos e eventualmente até físicos) e do subjetivo (próprio da psicologia). Isto com o cuidado de evitar a expectativa de um olhar de uma “superciência” interdisciplinar – tal qual destaca Fourez –, mas buscando compreender a realidade e seu contexto, a fim de contribuir com o desenvolvimento social.

Concordamos com a perspectiva de Sabucedo (1996) de que a Psicologia Política se define melhor por sua pluralidade que por sua uniformidade teórica e metodológica, e, no Brasil, entendemos que a Psicologia Política tem efetivamente assumido tal característica interdisciplinar. Por exemplo, em 2010, após dez anos do início da “Revista Psicologia Política” no Brasil, seus então editores, Alessandro Soares da Silva e Celso Zonta, destacaram que a publicação havia reunido mais de 180 autores e autoras de diversas áreas, como Antropologia, Administração, Educação, Educação Física, Filosofia, História, Política, Psicologia e Sociologia (SILVA & ZONTA, 2010).

A experiência do Grupo de Estudos e Pesquisa em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo (GEPSIPOLIM)

O Grupo de Pesquisa em Psicologia Política, Políticas Públicas e Multiculturalismo (GEPSIPOLIM) foi criado em 03 de abril de 2007 por docentes da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP) com apoio de docentes de outras instituições, como Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP).

A interdisciplinaridade é intrínseca aos moldes do grupo, pois congrega docentes e discentes de graduação e pós-graduação de diversos domínios do conhecimento, dedicando-se a questões relacionadas às linhas de pesquisa:

  • Ações Coletivas, Movimentos Sociais e Políticas Públicas

  • Consciência Política, Comportamento Político e Políticas Púbicas

  • Memória Política e Formações Identitárias

  • Multiculturalismo e Relações de Gênero, Raça/Etnia e Orientação Sexual

  • Psicologia Comunitária, Movimentos Sociais e Participação Política

Podem ser identificadas duas fases na organização do GEPSIPOLIM, a fase inicial, que compreende o período entre 2007 a 2010, e a segunda fase, que compreende o período entre 2010 e os tempos atuais.

Durante a primeira fase, o grupo era basicamente composto pelo seu coordenador,  Alessandro Soares da Silva, e por alunos de graduação dos diferentes cursos da EACH/USP, como as graduações em Lazer e Turismo, Gestão de Políticas Públicas, Marketing, Sistemas da Informação, Obstetrícia e Licenciatura em Ciências da Natureza. Neste período o grupo era mais ligado a atividades de extensão da Universidade de São Paulo, tendo se envolvido em diferentes projetos, como o “Mapeamento Cultural da Zona Leste de São Paulo”, em 2008, com financiamento da Fundação de Auxílio à USP (FUSP); e em 2009 com o projeto “Imagens da Cidadania”, realizado em parceria com a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo e financiado pelo Ministério da Educação do Brasil. O Grupo também esteve ligado à organização de eventos focados na Psicologia Política, como o V Simpósio Brasileiro de Psicologia Política e o Primeiro e o Segundo Encontros Paulistas de Psicologia Política.

Vale notar que os graduandos também estavam, em sua grande maioria, ligados a projetos de Iniciação Científica, e as reuniões do Grupo atuavam como um fervilhante e rico espaço de troca de experiências e conhecimentos sobre os projetos de pesquisa. Assim sendo, o que caracteriza a primeira fase do GEPSIPOLIM é a composição do grupo de pesquisa, sendo esta majoritariamente por discentes de graduação, e uma intensa atuação do grupo em projetos de extensão universitária, o que o aproximava de um grupo de trabalho e talvez o afastasse de um grupo propriamente de pesquisa.

Marcam o início da segunda fase do GEPSIPOLIM dois elementos importantes: (1) a criação e abertura do curso de Pós-Graduação Latu Sensu em Psicologia Política, Políticas Públicas e Movimentos Sociais, no primeiro semestre de 2010; e (2) a abertura e início do curso de Pós-Graduação Stricto Sensu em Mudança Social e Participação Política (ProMuSPP), no primeiro semestre de 2011. A partir de então, a Psicologia Política passou a ser uma disciplina oferecida nestes programas e a participação no grupo de pesquisa foi institucionalizada, ou seja, alunos que eram orientados por pesquisadores desta área eram automaticamente inscritos e convidados a participar das atividades.

Atualmente, 47 acadêmicos, sendo 17 docentes e 30 estudantes de graduação, mestrado e doutorado, compõem o GEPSIPOLIM. Debruçando-nos sobre dados coletados através de um questionário aberto submetido aos integrantes do grupo via correio eletrônico (Apêndice) e também a partir das informações contidas no currículo dos mesmos inscrito na Plataforma Lattes (base de dados de pesquisadores brasileiros mantida e gerenciada pelo Ministério de Ciência e Tecnologia do Brasil, acessível em lattes.cnpq.br), identificamos que as áreas de atuação dos pesquisadores do GEPSIPOLIM, a exemplo da origem do grupo, permanecem variadas, com profissionais e estudantes vindos da Psicologia, Sociologia, Educação, Assistência Social, Direito, Comunicação, Biologia, Assistência Social, Obstetrícia, Turismo, Educação Física, Gestão Ambiental e Gestão de Políticas Públicas.

Ao analisarmos o histórico dos participantes, temos que a maior parte deles desconhecia a Psicologia Política antes de participar do grupo de pesquisa. No entanto, alguns deles, principalmente os oriundos da graduação em psicologia, destacam que não conheciam a disciplina com este nome, mas que ao participar do grupo encontraram discussões e autores que já eram de seu conhecimento.

Observa-se também que muitos integrantes chegaram ao grupo de pesquisa via convite pessoal feito pelo coordenador do grupo, Alessandro Silva, especialmente os docentes. Já entre os estudantes, a maior parte dos atuais participantes, além do convite feito pelo professor, chegou ao grupo a partir da inscrição em disciplinas dos cursos de especialização e mestrado aos quais o grupo está vinculado.

O que se identifica é que estes pesquisadores e estudantes-pesquisadores encontraram no grupo terreno fértil para o desenvolvimento de suas pesquisas. O relato de uma doutoranda do curso de Oceonografia da Universidade de São Paulo (USP) ilustra esta situação:

“Conheci através da ementa da disciplina citada vista no Janus (sistema online de oferta de disciplinas de pós-graduação da USP). Estava buscando complementar minha formação, muito voltada para a área biológica, com estudos sobre políticas públicas. Minha principal indagação era o porquê de muitas das políticas públicas ambientais não seguirem determinações técnicas já consagradas. Busquei no campo da psicologia ambiental e social, sem muito sucesso, e acabei encontrando esta temática na psicologia política”.

Estes pesquisadores relatam terem encontrado na Psicologia Política uma dinâmica de pesquisa e produção do conhecimento que faz confluir abertura teórica, proveniente da interdisciplinaridade das discussões, com o desenvolvimento de uma consciência acadêmica crítica saudável para o desenvolvimento científico e político dos trabalhos realizados. A título de exemplo, destacamos o relato de um mestrando que desenvolve uma análise psicopolítica sobre sexualidade e direitos humanos entre participantes das paradas do orgulho LGBT de dois municípios brasileiros.

“A Psicologia Política cumpre um papel transformador para uma ciência que transpassa as disciplinas que nos orientamos na leitura da realidade e da sociedade, ou seja, traz desde sua produção, um teor político intencionalmente em se especializar e pensar em elementos específicos que representem conquistas ao saber humano. Certamente a Psicologia Política, bem como outros campos interdisciplinares, cumpre a responsabilidade desse olhar mais genérico e ampliado, em que tantos elementos objetivos quanto subjetivos são postos no mesmo plano de análise. Talvez represente uma ciência mais palatável ao senso comum, que se comunique com ele, de maneira a reconhecer o saber popular a partir dos parâmetros científicos. Sendo assim, entendo que os referenciais teóricos que a Psicologia Política traz em sua construção representam um ótimo referencial ao pensar num movimento social que se choca e acontece no cotidiano – as paradas do orgulho LGBT – as quais são concebidas também pelos discursos e temas que a compreendem, como sexualidade e direitos humanos”.

Essa percepção da Psicologia Política como um lugar interdisciplinar que reintegra as ciências sociais, desenvolvendo uma visão crítica da realidade sócio-política contemporânea, parece-nos ir ao encontro da perspectiva destacada por Dorna (2002), que por sua vez chama a atenção para a necessidade de se refletir sobre o desenvolvimento de um paradigma próprio ao campo dos fenômenos psicopolíticos, além de um quadro teórico e metodológico de estudo do comportamento humano em sociedade.

No que se refere ao GEPSIPOLIM e à perspectiva metodológica, a partir da análise dos trabalhos dos pesquisadores deste grupo, temos uma predominância de pesquisas realizadas a partir de métodos qualitativos, notadamente a realização de entrevistas seguida de análise de conteúdo ou de discurso, além de observações e pesquisas participantes. Entendemos que tais métodos de pesquisa sejam predominantes em função da natureza das pesquisas realizadas, via de regra, sobre temas que buscam compreender ações políticas contemporâneas, entendendo estas como “fenômenos complexos, não redutíveis à classificação em categorias fechadas, mas sim como processos em contínua mudança, sujeitos a interpretações múltiplas e variadas” (RIVAS; TOMÀS, 2003, p. 47).

Soma-se a isto a compreensão de que tais pesquisas trabalham, em sua maioria, com dados “subjetivos”, que só podem ser conseguidos com a contribuição de entrevistados ou a partir da observação/participação da realidade do sujeito ou grupo sob análise, constituem uma “representação da realidade: ideias, crenças, maneiras de pensar; opiniões, sentimentos, maneiras de sentir; maneiras de atuar; condutas; projeções para o futuro; razões conscientes ou inconscientes de determinadas atitudes e comportamentos” (MINAYO, 2009, p. 65).

Esta compreensão de que os métodos qualitativos de pesquisa permitem compreender elementos do subjetivo, pode ser ilustrada com a fala de uma mestranda do GEPSIPOLIM, que estuda as dinâmicas da consciência política de educadores sociais brasileiros. Para esta pesquisadora, a escolha de métodos qualitativos se deu “por entender que por meio da análise de entrevistas é possível apreender o sentido que os sujeitos, os educadores sociais, dão à sua participação, quer seja na formação, quer seja em outros espaços do cotidiano”.

Outra fala, agora de um jovem pesquisador da graduação, que se debruça sobre a questão da memória política e ação dos movimentos sociais, complementa esta perspectiva da pertinência dos métodos qualitativos. Para ele, ao priorizar tais metodologias, que ele intitula de “métodos não-convencionais”, seria possível alcançar “uma maior especificidade adequando-se bem ao objeto de estudo”.

O que refletimos a partir deste perfil teórico e metodológicos das pesquisas realizadas no âmbito do GEPSIPOLIM é que este espaço plural, constituído em uma tradicional instituição de ensino superior brasileira, a Universidade de São Paulo, dá pistas para a urgência entre pesquisadores e estudantes-pesquisadores de um campo de pesquisa que tenha um olhar mais integrativo da sociedade, preocupando-se sim com o fazer científico, mas sem, no entanto, desconsiderar o político, o social e o cultural desta prática, o que leva estes acadêmicos a optarem por temas, aporte teórico e metodológicos capazes de ir além do já instituído, o que como dissemos antes, o filósofo da ciência Thomas Kuhn chamaria de um momento de “revolução científica”.

Ações de divulgação da Psicologia Política

Além das discussões acadêmicas internas e da realização de pesquisas, o GEPSIPOLIM também esteve envolvido desde o seu princípio com a organização de eventos que visam fomentar o desenvolvimento e fortalecer a Psicologia Política no Brasil, e mais recentemente, na América Latina.

Já foram organizados pelo grupo dois seminários regionais de Psicologia Política (2009 e 2010) no estado de São Paulo; a quinta e a sexta edição do Simpósio Brasileiro de Psicologia Política (2009 e 2011), que aconteceram na EACH-USP em São Paulo e contaram com a participação de pesquisadores de diferentes países; o I Congreso Iberoamericano de Psicología Política (como grupo membro da organização) e o II Encuentro Iberoamericano de Grupos y Equipos de investigación en Psicología Política (como grupo membro da organização), estes últimos em 2011, assim como no apoio à organização do VII Simpósio Brasileiro de Psicologia Política, realizado em São Francisco de Paula, Rio Grande do Sul, organizado pelo Grupo de Psicologia Política, Educação e Histórias do Presente da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, em 2012.

O XXXIII Congresso Interamericano de Psicologia, ocorrido na Colômbia, em 2011, marcou a criação da Associação Ibero-Latinoamericana de Psicologia Política (AILPP). Neste evento, os participantes concordaram em direcionar a aprovação do Estatuto e assinatura da Ata Fundacional da Associação no próximo evento do campo em Córdoba, Argentina. Realizou-se, portanto, de 2 a 4 de novembro de 2011 o “1er Encuentro Ibero-Latinoamericano de Grupos y Equipos de Psicología Política”, dentro do “III Congreso de Psicología de la Facultad de Psicología de la Universidad Nacional de Córdoba: Ciéncia y Profesión” (31/10/11 – 2/11/2011).

Este encontro contou com a participação de uma importante e numerosa delegação brasileira, composta majoritariamente por alunos do Mestrado em Mudança Social e Participação Politica da USP, além de dois alunos de graduação e três docentes. Houve no Congresso uma comissão científica que julgou os mais de cem trabalhos apresentados em forma de pôster e, dois mestrandos do GEPSIPOLIM receberam o prêmio de melhores trabalhos.

Dentre as atividades do Encontro, ocorreu no último dia do evento a reunião de aprovação do Estatuto e fundação da AILPP. O documento do Estatuto que, conforme decidido no congresso anterior na Colômbia, foi produzido por um grupo de pesquisadores dirigidos pelo coordenador do GEPSIPOLIM, Alessandro Silva. Após a leitura e discussão dos elementos constantes no documento, os participantes concordaram que o Estatuto seria revisado e editado por pesquisadores dos diferentes países ali presentes, permitindo uma construção coletiva do documento, e seria levado para aprovação no evento subsequente, em Lima, no Peru. Deu-se, porém, na reunião, a fundação da Associação Ibero-Latinoamericana de Psicologia Politica, com aprovação por voto dos presentes.

Em agosto de 2012 aconteceu o 1o Congreso Iberoamericano de Psicología Política e o 2o Encuentro de Equipos y Grupos de Inverstigación en Psicología Política de la AILPP, em Lima, Peru. Neste evento deu-se a leitura, apresentação e aprovação do Estatuto da AILPP, formalizando sua existência. Foram previstas ações de fortalecimento dos periódicos Psicologia Politica brasileiro, argentino e espanhol, que tornaram-se os veículos oficiais de informação da AILPP (SILVA & ZONTA, 2011).

Estes episódios narram a importância do GEPSIPOLIM na consolidação da AILPP, uma associação que, conforme o documento final do seu Estatuto, tem por fim congregar grupos de pesquisa e demais interessados no desenvolvimento da Psicologia Politica na Ibero-Latinoamerica, garantir o relacionamento de pesquisadores do campo, propiciar a difusão do conhecimento e o desenvolvimento interdisciplinar e incentivar ações institucionais que desenvolvam o campo. Com vistas a cumprir os objetivos aos quais se propõe, a AILPP deve promover e gerir atividades técnico-científicas como congressos, reuniões, seminários, conferências, incentivar o diálogo entre os países membros e apoiar a edição e publicação de documentos científicos interessantes ao campo.

Além dos eventos científicos, o GEPSIPOLIM, encabeçado e motivado por seu coordenador, Alessando Silva, esteve à frente da criação do primeiro curso de Pós-graduação em Psicologia Política (nível lato sensu) no Brasil. O curso de Especialização intitulado “Psicologia Política, Políticas Públicas e Movimentos Sociais” foi criado no sentido de fomentar o desenvolvimento da disciplina com produções científicas do campo. As experiências internacionais de cursos de pós-graduação em Psicologia Política apontam para a criação dos programas em nível de mestrado (stricto sensu) em 1973 nos Estados Unidos e Europa. Alinhados a estes cursos, deu-se a fundação da International Society of Political Psychology na University of California em 1978 e a Associação Brasileira de Psicologia Política em 2000 na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, responsável pela editoração e gerenciamento da Revista Psicologia Política.

Com carga horária de 500 horas e previsto para 18 meses, o curso de Especialização provê formação específica no campo, incentivando o pensamento crítico das relações de fenômenos subjetivos com foco em questões teórico-práticas num campo interdisciplinar. Ao fim do curso, o aluno deve defender uma monografia que tem por objetivo fomentar o desenvolvimento científico da Psicologia Política através de pesquisas orientadas por professores-doutores. Cinco módulos compõem a estrutura conceitual do grupo, são eles: 1. Fundamentos de Psicologia Política; 2. Fundamentos em Movimentos Sociais; 3. Estado, Políticas Públicas e Sociedade Civil; 4. Organização Política e Participação Popular; e 5. Métodos de Intervenção e Metodologia de Pesquisa (EACH USP, 2012).

O GEPSIPOLIM esteve também presente ativamente na criação do programa de mestrado em Mudança Social e Participação Política, quando novamente o Prof. Alessandro Soares da Silva foi o principal idealizador do programa stricto sensu. O programa iniciou as suas atividades no primeiro semestre de 2011 e tem por objetivo formar pesquisadores capazes de discutir e analisar questões relacionadas à sociedade a partir de um olhar interdisciplinar. No escopo do programa, há três questões balizadoras: as teóricas e metodológicas do campo da Mudança Social e da Participação Politica; aquelas que se referem aos efeitos causados pela Mudança Social devido aos processos de mobilização; e, finalmente, aquelas relacionadas à produção da Mudança Social (EACH USP, 2012). Pretende-se que a produção científica decorrente deste programa envolva dinâmicas sociais que olhem para as transformações e questões de desenvolvimento local, bem como, ações coletivas e a presença/influência do elemento político nas relações cotidianas.

No que se refere à produção bibliográfica, o GEPSIPOLIM está envolvido com a administração da Revista Psicologia Política (RPP), fornecendo apoio institucional e técnico à revista, que teve sua primeira edição em 2001 e atualmente encontra-se no número 22, volume 11.

A revista, nas palavras de seus então editores em 2011, Alessandro Soares da Silva e Celso Zonta, está editorialmente interessada

com desenvolvimento deste campo interdisciplinar de reflexão e prática investigativa, no qual os principais debates têm sido reunidos em torno de questões como o preconceito social, diferentes formas de racismo e xenofobia, ações coletivas e movimentos sociais, violência coletiva e social, socialização política, comportamento eleitoral, relações de poder, valores democráticos e autoritarismos, participação social e políticas públicas, bem como os estudos sobre opinião pública e meios de comunicação de massa (SILVA& ZONTA, 2011, p.8).

Para a gestão editorial de 2012-2015 a revista tem publicação quadrimestral, sendo um fascículo editado conjuntamente com a Revista Eletrónica de Psicologia Política (Argentina). A edição conjunta Revista de Psicologia Política e Revista Eletrónica de Psicologia Política fica sob responsabilidade editorial do Prof. Dr. Agustin Espinosa Pezzia – PUCP – Peru. Como já observado antes, a Psicologia Política vem se constituindo um campo interdisciplinar e a interação transnacional pode somente contribuir para o desenvolvimento e enriquecimento deste.

A partir do número 20, a Revista de Psicologia Política brasileira passou a ser editada somente eletronicamente, procedimento que deverá agilizar o processo editorial e ampliar a divulgação da mesma.

Até o presente momento foram publicados 190 artigos ao longo das 22 edições da revista. Em organização livre realizada pelos autores deste artigo, agrupamos a totalidade dos artigos publicados na Revista de Psicologia Política em quinze grandes temas, sendo eles:

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Este breve levantamento evidencia a interdisciplinaridade presente na Psicologia Política e a rica pluralidade presente neste campo de estudos no âmbito brasileiro. Contudo, podemos observar a prevalência de artigos orbitando na temática de “Política/Regimes Políticos”, “Movimentos Socais/Ação Coletiva” e “Gênero/Sexualidade/Homossexualidade”, questões marcantes da Psicologia Política, que inclusive ocuparam papéis de destaque nos V, VI e VII Simpósios Brasileiros de Psicologia Política e nos encontros regionais de Psicologia Política. Outros temas que se destacam entre as publicações da Revista de Psicologia Política são os artigos voltados para discussões epistemológicas, importantes para a consolidação deste campo, bem como a presença de artigos sobre “Relações de Trabalho”, “Identidades” e “Direitos Humanos”.

Além da Revista de Psicologia Política, o GEPSIPOLIM também foi responsável pela produção do livro “Psicologia Política: Debates e Embates de um Campo Interdisciplinar”, publicado eletronicamente em 2012 pela Editora da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (Edições EACH). A obra apresenta reflexões dos membros do grupo sobre suas áreas de pesquisa, revelando a pluralidade disciplinar desta equipe de pesquisa.

Considerações

A partir da relação entre a literatura revista sobre Psicologia Política e a experiência do GEPSIPOLIM relatada no presente artigo, podemos destacar a característica interdisciplinar desta disciplina, ainda que reconheçamos e tenhamos por base a noção de que, a exemplo do observado por Neil Kressel (1993), a Psicologia Política se vale de concepções psicológicas para a compreensão da política e de análises políticas para o estudo dos efeitos psicológicos. No entanto, entendemos que algumas questões teórico-metodológicas permanecem (e devem permanecer) em constante discussão a fim de que suas bases paradigmáticas sejam bem definidas e estabelecidas, e para evitar - parafraseado Fourez (1995) - o desenvolvimento de uma “super ciência interdisciplinar”.

Mesmo que esta disciplina favoreça um maior diálogo entre as áreas, possibilitando a busca de respostas para as dinâmicas políticas contemporâneas, quais bases teóricas e quais técnicas de busca e análise de dados melhor se encaixam a ela, possibilitando análises que dão conta da complexidade do momento atual? Propomos ainda outro questionamento: qual o olhar dos pesquisadores em Psicologia Política ao se valerem de técnicas e bases teóricas já estabelecidas por outras disciplinas para a análise dos fenômenos políticos contemporâneos?

A partir deste último questionamento, podemos refletir se o caminho desta disciplina não seria de fomentar um rico e profundo debate intelectual sobre como “ler” estes dados neste contexto político e sócio-histórico atual. Talvez assim, como destacado por Dorna (2002), a Psicologia Política poderia se constituir como um centro de reintegração das ciências sociais onde os pesquisadores oriundos de suas disciplinas de base encontrariam possibilidades de leituras analíticas dos dados que possuem.

Para isto, reforçamos a importância da somatória de esforços entre pesquisadores e  grupos de pesquisa de Psicologia Política, para a realização de eventos científicos e a organização de publicações sobre o tema, a fim de fomentar tais reflexões e criar espaços acadêmicos seguros para estudantes e professores, levando assim, como conseqüência, à delimitação com maior clareza das bases paradigmáticas desta disciplina.

Referências bibliográficas

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